Nosso Verdadeiro Lar

Uma palestra para uma disc�pula leiga idosa que est� morrendo

Por Ajahn Chah

Agora determine que a sua mente ou�a o Dhamma. Durante o per�odo em que eu estiver falando, preste aten��o �s minhas palavras como se o pr�prio Buda estivesse sentado � sua frente. Feche os olhos e sente-se confortavelmente, componha a sua mente e fa�a com que ela foque a aten��o em um s� ponto. Com humildade permita que a J�ia Tr�plice da sabedoria, verdade e pureza encontre um lugar no seu cora��o como forma de demonstrar o seu respeito pelo Iluminado.

Hoje eu n�o trouxe nada material, com subst�ncia para oferecer-lhe, somente o Dhamma, os ensinamentos do Buda. Ou�a bem. Voc� precisa entender que mesmo o pr�prio Buda, com o seu grande dep�sito de virtude acumulada, n�o p�de evitar a morte f�sica. Quando ele alcan�ou a velhice, ele abandonou o seu corpo e soltou o seu pesado fardo. Agora voc� tamb�m precisa aprender a estar satisfeita com os muitos anos em que esteve sujeita a esse corpo. Voc� deveria sentir que j� chega.

Voc� pode compar�-lo a utens�lios de cozinha que teve por muito tempo - suas x�caras, pires, pratos e assim por diante. Quando voc� os comprou eles estavam limpos e brilhantes mas agora ap�s us�-los por tanto tempo, eles mostram os sinais do tempo. Alguns j� est�o quebrados, outros desapareceram e aqueles que sobraram est�o se deteriorando; eles n�o possuem uma forma est�vel, e faz parte da sua natureza que seja assim. Com o corpo � o mesmo - esteve continuamente mudando desde o dia em que voc� nasceu, atrav�s da inf�ncia e adolesc�ncia, at� agora quando alcan�ou a velhice. Voc� precisa aceitar isso. O Buda disse que os fen�menos, (sankharas), quer sejam internos, do corpo, ou externos, s�o desprovidos de um eu, a mudan�a faz parte da natureza deles. Contemple essa verdade at� que voc� a veja claramente.

Esse mesmo peda�o de carne que aqui est� deitado em decad�ncia � saccadhamma, a verdade. A verdade deste corpo � saccadhamma, e esse � o ensinamento imut�vel do Buda. O Buda nos ensinou a olhar para o corpo, contempl�-lo e aceitar a sua natureza. Precisamos estar em paz com o corpo, n�o importando o estado em que ele esteja. O Buda ensinou que devemos nos assegurar que somente o corpo esteja aprisionado e n�o permitir que a mente seja aprisionada junto. Agora, � medida que o seu corpo come�a a perder vitalidade e deteriorar pela idade, n�o resista a isso, mas n�o permita que a sua mente se deteriore junto com ele. Mantenha a mente separada. Energize a sua mente compreendendo a verdade de como as coisas s�o. O Buda ensinou que essa � a natureza do corpo, n�o pode ser de outra forma: tendo nascido, ele envelhece e se enferma e depois morre. Essa � uma grande verdade com a qual voc� est� se deparando agora. Olhe para o corpo com sabedoria e entenda isso.

Se a sua casa estiver inundada ou completamente queimada, qualquer que seja o perigo que a ameace, fa�a com que seja somente com a casa. Se ocorrer uma enchente, n�o permita que ela inunde a sua mente. Se ocorrer um inc�ndio, n�o permita que ele queime o seu cora��o. Deixe que seja somente a casa, aquilo que � externo a voc�, fique inundada e queimada. Permita que a mente se liberte dos seus apegos. Este � o momento certo.

Voc� j� est� viva h� muito tempo. Os seus olhos j� viram inumer�veis formas e cores, os seus ouvidos ouviram tantos sons, voc� teve incont�veis experi�ncias. E isso � tudo que elas foram - somente experi�ncias. Voc� comeu comidas deliciosas, e todos os sabores deliciosos foram somente sabores deliciosos, nada mais. Os sabores desagrad�veis foram somente sabores desagrad�veis, isso � tudo. Se o olho v� uma forma bonita, isso � tudo, somente uma forma bonita. Uma forma feia � somente uma forma feia. O ouvido ouve um som que hipnotiza, melodioso e n�o � nada al�m disso. Um som �spero, sem harmonia � somente isso.

O Buda disse que pobre ou rico, jovem ou velho, humano ou animal, nenhum ser neste mundo pode manter a si mesmo em um mesmo estado por muito tempo, tudo experimenta mudan�a. Esse � um fato da vida para o qual n�o h� rem�dio. Mas o Buda disse que o que podemos fazer � contemplar o corpo e a mente de tal forma a ver a sua impersonalidade, ver que nenhum deles � "eu" ou "meu". Eles possuem meramente uma realidade provis�ria. � como esta casa: ela � sua somente de forma nominal, voc� n�o a pode levar para nenhum lugar. Ocorre o mesmo com a sua fortuna, as suas posses e a sua fam�lia - elas s�o todas suas somente no nome, na verdade elas n�o lhe pertencem, elas pertencem � natureza. Agora essa verdade n�o se aplica somente a voc�, todos est�o na mesma posi��o, mesmo o Buda e os seus disc�pulos iluminados. Eles diferem de n�s apenas num aspecto, na aceita��o das coisas do modo como elas s�o, eles viram que n�o pode ser de outro modo.

Portanto o Buda nos ensinou a mapear e examinar este corpo, das solas dos p�s at� o topo da cabe�a e em seguida at� as solas dos p�s novamente. D� uma olhada no corpo. Que tipo de coisas voc� v�? Existe algo que seja intrinsecamente limpo? Voc� pode encontrar alguma ess�ncia permanente? Todo este corpo est� constantemente se degenerando e o Buda nos ensinou a ver que ele n�o nos pertence. Faz parte da natureza que o corpo seja assim porque todos os fen�menos condicionados est�o sujeitos � mudan�a. De que outra forma poderia ser? Na verdade, n�o existe nada de errado com o corpo. N�o � o corpo que faz com que voc� sofra, mas sim a sua forma de pensar incorreta. Quando voc� v� o certo de maneira errada, inevitavelmente haver� confus�o. � como a �gua de um rio. Ela naturalmente flui quando h� uma inclina��o, ela nunca flui em sentido contr�rio, assim � a natureza. Se uma pessoa estivesse �s margens de um rio e vendo a correnteza fluindo rapidamente, tolamente desejasse que as �guas flu�ssem em sentido contr�rio, ela ir�a sofrer. O que quer que ela estivesse fazendo, a sua maneira errada de pensar n�o lhe daria paz. Ela ficaria infeliz devido ao seu entendimento incorreto, pensando contra a correnteza. Se ela tivesse o entendimento correto ela veria que a �gua deve inevitavelmente fluir de acordo com a inclina��o, e at� que ela entenda e aceite esse fato, a pessoa ficar� agitada e preocupada.

O rio que flui de acordo com a inclina��o � igual ao seu corpo. Tendo sido jovem seu corpo envelheceu e agora est� fluindo tranq�ilamente para a morte. N�o fique desejando que seja diferente, n�o � algo que voc� tem o poder de remediar. O Buda nos disse para ver as coisas como elas s�o e ent�o soltar o nosso apego em rela��o a elas. Tome essa no��o de abandono como o seu ref�gio.

Sustente a medita��o, mesmo que voc� se sinta cansada e exausta. Deixe que a sua mente permane�a com a respira��o. Respire fundo algumas vezes e depois fixe a mente na respira��o usando a palavra "Buddho" como mantra. Fa�a disso uma pr�tica rotineira. Quanto mais exausta voc� estiver, mais sutil e focalizada deve ser a sua concentra��o, assim voc� poder� suportar as sensa��es dolorosas que surgem. Quando voc� come�ar a se sentir cansada, fa�a com que todo o seu pensamento pare, que a mente se recupere e se volte para conhecer a respira��o. Mantenha a recita��o interior: "Bud-dho, Bud-dho". Solte tudo que � externo. N�o se apegue a pensamentos acerca dos seus filhos e parentes, n�o se apegue a absolutamente nada. Solte. Deixe que a mente se unifique em um s� ponto e permita que essa mente acalmada permane�a com a respira��o. Fa�a com que a respira��o seja o seu �nico objeto de interesse. Concentre at� que a mente se torne cada vez mais sutil, at� que as sensa��es sejam insignificantes e que haja uma grande clareza e vivacidade interiores. Ent�o quando surgirem sensa��es dolorosas elas ir�o gradualmente ceder por si mesmas. Finalmente, voc� ir� olhar para a respira��o como se fosse um parente que a tivesse vindo visitar.

Quando um parente vai embora, n�s o acompanhamos at� a porta. Esperamos at� que j� n�o o possamos ver mais e ent�o voltamos para dentro. Observamos a respira��o da mesma forma. Se a respira��o � grosseira, n�s sabemos que ela � grosseira. Se ela � sutil, sabemos que � sutil. � medida que ela vai se tornando cada vez mais discreta n�s a acompanhamos, simultaneamente despertando a mente. Eventualmente a respira��o desaparece por completo e tudo o que resta � a sensa��o de estar alerta. A isto se denomina encontrar o Buda. Temos aquele entendimento cristalino que � chamado de "Buddho", aquele que sabe, aquele que est� desperto, aquele que irradia. � encontrar e permanecer com o Buda, com conhecimento e clareza. Pois foi somente o Buda hist�rico de carne e osso que realizou o parinibbana; o verdadeiro Buda, o Buda que � o conhecimento claro e luminoso, n�s podemos experimentar e realizar mesmo hoje e quando assim fizermos, o cora��o � um s�.

Portanto, solte, deixe tudo de lado, tudo exceto o conhecimento. N�o se iluda se vis�es ou sons surgirem na sua mente durante a medita��o. Deixe-os de lado. N�o se apegue a absolutamente nada. Permane�a apenas com essa aten��o n�o dual. N�o se preocupe com o passado ou o futuro, fique tranq�ila e voc� ir� alcan�ar o lugar onde n�o existe progresso, recuo e nem parada, onde n�o existe nada para se agarrar ou apegar. Porque? Porque n�o existe "eu" ou "meu". Tudo se foi. O Buda nos ensinou a que fiquemos vazios desse modo, a n�o carregar nada conosco. Conhecendo e tendo conhecido, solte.

Realizar o Dhamma, o caminho da liberta��o do ciclo de nascimento e morte, � uma tarefa que todos temos que realizar sozinhos. Portanto, continue tentando soltar tudo e entender os ensinamentos. Coloque esfor�o real na sua contempla��o. N�o se preocupe com a sua fam�lia. No momento eles s�o o que s�o, no futuro ser�o como voc�. N�o existe ningu�m neste mundo que possa escapar a esse destino. O Buda nos disse para deixar de lado tudo aquilo que n�o possui uma ess�ncia verdadeira, permanente. Se voc� colocar tudo de lado, ir� ver a verdade, se voc� n�o fizer isso, n�o ir� v�-la. Assim � como �, igual para todos, portanto n�o se preocupe e n�o se agarre a nada.

Mesmo que voc� se d� conta de que est� pensando, n�o h� problema, contanto que voc� pense sabiamente. N�o pense de maneira tola. Se voc� pensar nos seus filhos, pense neles com sabedoria, n�o de forma tola. Qualquer coisa que chame a aten��o da mente, pense e entenda aquela coisa com sabedoria, consciente da sua natureza. Se voc� entende alguma coisa com sabedoria, ent�o voc� a solta e n�o h� sofrimento. A mente estar� brilhante, feliz e em paz, e evitando distra��es ela estar� unificada. Neste momento o que lhe pode ajudar e apoiar � a sua respira��o.

Essa � uma tarefa sua, de ningu�m mais. Deixe que os outros fa�am as tarefas deles. Voc� tem a sua pr�pria tarefa e responsabilidade e voc� n�o precisa assumir aquelas da sua fam�lia. N�o assuma nada mais, solte tudo. Esse ato de soltar ir� acalmar a sua mente. A sua �nica responsabilidade agora � de focar a sua mente e fazer com que ela fique em paz. Deixe todo o demais para os outros. Formas, sons, odores, sabores - deixe que os outros tomem conta disso. Deixe tudo isso de lado e fa�a o seu pr�prio trabalho, cumpra a sua responsabilidade. O que quer que surja na sua mente, seja medo ou dor, medo da morte, ansiedade pelos outros ou o que seja, diga-lhes: "N�o me perturbem. Voc�s n�o s�o mais minha responsabilidade". Apenas diga isso para si mesma quando voc� vir esses dhammas surgindo.

A que se refere a palavra "dhamma" ? Tudo � dhamma. N�o existe nada que n�o seja dhamma. E o que seria "mundo" ? O mundo � exatamente o estado mental que a est� deixando agitada neste mesmo momento. "O que essa pessoa ir� fazer? O que aquela pessoa ir� fazer? Quando eu estiver morta quem ir� cuidar deles? Como eles ir�o se arranjar?" Isso tudo � "o mundo". Mesmo o mero surgimento de um pensamento de medo ou dor, � o mundo.

Jogue o mundo fora! O mundo � assim mesmo. Se voc� permitir que ele surja na mente e domine a consci�ncia ent�o a mente se tornar� nebulosa e n�o poder� ver a si mesma. Portanto, para tudo que surgir na mente, simplesmente diga: "N�o diz respeito a mim. � impermanente, insatisfat�rio e n�o-eu."

Pensar que voc� gostaria de viver por muito tempo a far� sofrer. Mas pensar que voc� gostaria de morrer logo ou muito rapidamente tamb�m n�o � correto, � sofrimento n�o �? As condi��es n�o nos pertencem, elas seguem as suas pr�prias leis da natureza. Voc� n�o pode fazer nada acerca do modo como o corpo �. Voc� pode embelez�-lo um pouco, fazer com que seja atraente e limpo durante algum tempo, tal como as garotas que passam batom e deixam as unhas crescer. Por�m, quando a velhice chega, todos est�o no mesmo barco. O corpo � assim, voc� n�o pode fazer com que seja de outro modo. Mas o que voc� pode melhorar e embelezar � a mente.

Qualquer pessoa pode construir uma casa de madeira e tijolos mas o Buda ensinou que esse tipo de casa n�o � o nosso verdadeiro lar, � nosso s� nominalmente. � uma casa no mundo e segue as regras do mundo. O nosso verdadeiro lar � a paz interior. Uma casa pode muito bem ser bonita mas n�o tem muita paz. Existe esta preocupa��o e depois aquela, esta ansiedade e depois aquela. Portanto dizemos que ela n�o � o nosso verdadeiro lar, est� fora de n�s, cedo ou tarde vamos ter que abrir m�o dela. N�o � um lugar em que podemos viver permanentemente porque na verdade n�o nos pertence, � parte do mundo. Com o nosso corpo ocorre o mesmo; assumimos que ele seja parte do eu, que seja "eu" e "meu", mas na verdade n�o � nada disso, � uma outra casa do mundo. O seu corpo seguiu o seu curso natural do nascimento at� agora, est� velho e enfermo e voc� n�o pode proibi-lo disso, assim � como �. Querer que seja diferente � t�o tolo quanto querer que um pato seja uma galinha. Quando voc� v� que isso � imposs�vel, que um pato tem que ser um pato, e que uma galinha tem que ser uma galinha, que os corpos t�m que envelhecer e morrer, voc� ter� energia e for�a. N�o importa quanto voc� queira que o corpo se mantenha e dure por muito tempo, isso n�o ir� ocorrer.

O Buda disse:

Anicca vata sankhara
Uppada vayadhammino
Uppajjhitva nirujjhanti
Tesam vupasamo sukho
.

As forma��es s�o impermanentes,
sujeitas a surgir e cessar.
Tendo surgido elas cessam -
a tranq�iliza��o delas � uma b�n��o.

A palavra "sankhara" refere-se a este corpo e mente. Os sankharas s�o impermanentes e inst�veis, tendo surgido eles desaparecem, tendo aparecido eles cessam, e mesmo assim todos querem que eles sejam permanentes. Isso � uma tolice. Olhe para a respira��o. Tendo entrado, ela sai, assim � a natureza, assim � como deve ser. A inspira��o e a expira��o t�m que se alternar, tem que haver mudan�a. Os sankharas existem atrav�s da mudan�a, voc� n�o poder� evit�-lo. Apenas pense: voc� poderia expirar sem haver inspirado? Voc� se sentiria bem? Ou voc� poderia somente inspirar? Queremos que as coisas sejam permanentes, mas elas n�o podem ser, � imposs�vel. Uma vez que tenhamos inspirado, � necess�rio expirar, quando expiramos � necess�rio inspirar outra vez, e assim � a natureza, n�o �? Tendo nascido, envelhecemos e ficamos enfermos e depois morremos e isso � perfeitamente natural e normal. Porque os sankharas fizeram a sua parte, porque a expira��o e a inspira��o se alternaram dessa forma, que a ra�a humana ainda est� aqui hoje.

Assim que nascemos, estamos mortos. Nosso nascimento e morte s�o somente uma coisa. Tal como uma �rvore: quando h� uma raiz tem que haver galhos. Quando h� galhos tem que haver uma raiz. N�o se pode ter uma sem a outra. � um pouco engra�ado ver como face � morte as pessoas ficam t�o angustiadas e distra�das, chorosas e tristes e no nascimento t�o felizes e contentes. � a delus�o, ningu�m nunca v� isso com clareza. Eu penso que se voc� realmente quer chorar, ent�o seria melhor faz�-lo quando algu�m nasce. Pois na verdade o nascimento � morte, morte � nascimento, a raiz � o galho, o galho a raiz. Se voc� precisa chorar, chore pela raiz, chore pelo nascimento. Veja com aten��o: se n�o houvesse nascimento n�o haveria morte. Voc� pode entender isso?

N�o pense muito. Somente pense: "Assim � como as coisas s�o". � a sua tarefa, a sua responsabilidade. Neste exato momento ningu�m pode ajud�-la, n�o h� nada que a sua fam�lia e as suas posses possam fazer por voc�. A �nica coisa que lhe pode ajudar � o entendimento correto.

Portanto n�o vacile. Solte tudo. Jogue tudo fora.

Mesmo que voc� n�o queira soltar, tudo est� indo embora de qualquer jeito. Voc� pode ver como todas as diferentes partes do seu corpo est�o tentando escapar? Tome o seu cabelo: quando voc� era jovem ele era grosso e preto, agora ele est� caindo. Est� indo embora. Os seus olhos costumavam ser bons e fortes e agora eles est�o fracos, a sua vista emba�ada. Quando os �rg�os j� n�o ag�entam mais, eles v�o embora, esta n�o � a casa deles. Quando voc� era uma crian�a os seus dentes eram sadios e firmes agora eles est�o balan�ando, talvez voc� tenha dentadura. Os seus olhos, ouvidos, nariz, l�ngua - tudo est� tentando ir embora porque esta n�o � a casa deles. Voc� n�o pode fazer uma morada permanente em um sankhara, voc� pode permanecer por pouco tempo e depois tem que partir. O mesmo que um inquilino observando a sua pequena casa com os olhos enfraquecidos. Os seus dentes j� n�o est�o bem, os seus ouvidos j� n�o est�o bem, o seu corpo j� n�o est� saud�vel, todos est�o partindo.

Portanto voc� n�o precisa se preocupar com nada, porque este n�o � o seu verdadeiro lar, � somente um abrigo tempor�rio. Tendo vindo a este mundo, voc� deveria contemplar a sua natureza. Tudo o que existe est� se preparando para desaparecer. Olhe para o seu corpo. Existe algo que ainda se encontre na sua forma original? A sua pele est� como costumava estar? O seu cabelo? N�o � o mesmo, �? Para onde foi tudo? Assim � a natureza, como as coisas s�o. Quando o tempo chega, as forma��es seguem o seu pr�prio curso. N�o h� nada neste mundo com o qual se possa contar - � um ciclo intermin�vel de perturba��es e problemas, prazeres e dores. N�o h� paz.

Quando n�o temos um verdadeiro lar somos como um viajante sem rumo, indo em uma dire��o por algum tempo e depois para outra dire��o, parando por algum tempo para depois continuar outra vez. At� que regressemos ao nosso verdadeiro lar nos sentimos desconfort�veis com o que quer que estejamos fazendo, da mesma forma como uma pessoa que saiu do seu vilarejo para uma viagem. Somente quando regressa outra vez para casa � que ela pode realmente relaxar e estar em paz.

Em nenhum lugar do mundo pode ser encontrada a paz verdadeira. Os pobres n�o t�m paz e nem os ricos. Os adultos n�o t�m paz, as crian�as n�o t�m paz, aqueles com pouca escolaridade n�o t�m paz e nem os que t�m muito estudo. N�o existe paz em lugar nenhum. Essa � a natureza do mundo.

Aqueles que possuem poucas posses sofrem e da mesma forma aqueles que possuem muitas. Crian�as, adultos, velhos, todos sofrem. O sofrimento de ser velho, o sofrimento de ser jovem, o sofrimento de ser rico e o sofrimento de ser pobre - nada al�m de sofrimento.

Quando voc� contempla as coisas dessa forma voc� v� anicca, imperman�ncia e dukkha, insatisfa��o. Porque as coisas s�o impermanentes e n�o trazem satisfa��o? � porque s�o anatta, n�o-eu.

Ambos, o seu corpo que est� aqui deitado enfermo e dolorido e a mente que est� consciente da sua enfermidade e dor, s�o denominados dhammas. Aquilo que � desprovido de forma, os pensamentos, sensa��es e percep��es s�o denominados namadhamma. Aquilo que est� atormentado com dores e desconfortos � denominado rupadhamma. O material � dhamma e o n�o material � dhamma. Portanto vivemos com dhammas, no dhamma, n�s somos dhamma. Na verdade n�o existe um eu que pode ser encontrado em nenhum lugar, s� existem dhammas que est�o continuamente surgindo e desaparecendo, que � a sua natureza. A cada momento estamos experimentando o nascimento e a morte. Assim � como as coisas s�o.

Quando pensamos no Buda, da forma t�o verdadeira como ele falou, sentimos o quanto ele � digno de que o saudemos, honremos e respeitemos. Sempre que vemos a verdade de algo, vemos os seus ensinamentos, mesmo sem nunca, na verdade termos praticado o Dhamma. Por�m mesmo que tenhamos conhecimento dos seus ensinamentos, que os tenhamos estudado e praticado, mas ainda sem ver a verdade que eles cont�m, ent�o ainda n�o teremos um lar.

Portanto, compreenda esse ponto de que todas as pessoas, todas as criaturas, est�o prestes a ir embora. Quando os seres viverem um certo tempo eles seguir�o o seu caminho. O rico, o pobre, o jovem, o velho, todos os seres ir�o experimentar essa mudan�a.

Quando voc� se der conta de que o mundo � assim, voc� sentir� que � um lugar que incomoda muito. Quando voc� se der conta de que n�o h� nada est�vel ou s�lido em que voc� possa confiar, voc� se sentir� incomodado e desencantado. Sentir-se desencantado no entanto n�o significa que voc� ter� avers�o. A mente estar� clara. Ela v� que n�o existe nada que possa ser feito para remediar esse estado de coisas, assim � o mundo. Sabendo disso, voc� pode soltar o apego, soltar com a mente que n�o est� feliz nem triste mas em paz com os sankharas, pois v� com sabedoria a sua natureza de mudan�a constante.

Anicca vata sankhara – todas as forma��es s�o impermanentes. Colocando de maneira simples: imperman�ncia � o Buda. Se vemos um fen�meno impermanente com clareza, veremos que ele � permanente, permanente no sentido de que a sua sujei��o � mudan�a � constante. Essa � a perman�ncia que os seres vivos possuem. Existe transforma��o cont�nua, da inf�ncia atrav�s da juventude at� a velhice, e essa mesma imperman�ncia, essa disposi��o � mudan�a � fixa e permanente. Se voc� encar�-lo dessa forma o seu cora��o estar� em paz. N�o � somente voc� que tem que passar por isso, s�o todos.

Quando voc� considera as coisas dessa forma, voc� as ver� como um inc�modo e o desencantamento ir� surgir. O seu deleite com o mundo dos prazeres sensuais ir� desaparecer. Voc� ver� que se tiver muitas coisas, ter� que abandonar muitas coisas; se tiver poucas, abandonar� poucas. A riqueza � somente riqueza, uma vida longa � somente uma vida longa, elas n�o t�m nada de especial.

O que � importante � que fa�amos o que o Buda nos ensinou e que construamos o nosso lar, construi-lo utilizando o m�todo que eu estive lhe explicando. Construa o seu lar. Solte tudo. Solte at� que a mente alcance a paz que est� livre de avan�ar, livre de retroceder e livre de ficar im�vel. O prazer n�o � o nosso lar, a dor n�o � o nosso lar. O prazer e a dor, ambos, decaem e desaparecem.

O Grande Mestre viu que todos os sankharas s�o impermanentes e por isso ele nos ensinou a soltar o nosso apego por eles. Quando chegarmos ao fim das nossas vidas, n�o teremos escolha de qualquer maneira, n�o seremos capazes de levar nada conosco. Portanto n�o seria melhor se soltar das coisas antes disso? Elas s�o somente um fardo pesado que carregamos; porque n�o se desfazer desse fardo agora? Porque o esfor�o de carreg�-lo conosco? Solte tudo, relaxe e deixe que a sua fam�lia tome conta de voc�.

Aqueles que cuidam de um enfermo, cultivam a bondade e a virtude. Algu�m que esteja doente e que oferece aos outros essa oportunidade n�o deveria dificultar ainda mais as coisas para eles. Se existe dor ou algum outro problema, diga-lhes e mantenha a mente em um estado saud�vel. Aquele que estiver cuidando dos pais deve preencher a sua mente com cordialidade e bondade e n�o se deixar pegar pela avers�o. Essa � a ocasi�o em que voc� pode pagar o seu d�bito para com eles. Desde o seu nascimento atrav�s da inf�ncia, conforme voc� crescia, voc� esteve na depend�ncia dos seus pais. Estamos aqui hoje porque as nossas m�es e pais nos ajudaram de tantas formas. Devemos a eles muita gratid�o.

Portanto hoje, todos voc�s, crian�as e parentes aqui reunidos, juntos, vejam como os seus pais se tornam as suas crian�as. Antes voc�s eram as crian�as deles; agora eles s�o as crian�as de voc�s. Eles ficam cada vez mais velhos at� que se convertem em crian�as novamente. A sua mem�ria fica falha, os olhos j� n�o v�m t�o bem e os seus ouvidos n�o escutam, �s vezes misturam as palavras. N�o deixem que isso os perturbe. Todos voc�s que cuidam dos doentes t�m que aprender a soltar. N�o se agarrem �s coisas, simplesmente soltem-nas e que sigam o seu pr�prio curso. Quando uma crian�a � desobediente, �s vezes os pais permitem que ela fa�a o que quer como forma de manter a paz, para faz�-la feliz. Agora os seus pais s�o como essa crian�a. A mem�ria e a percep��o deles est� confusa. Certas vezes eles confundem os seus nomes, ou voc�s lhes pedem para trazer uma x�cara e eles trazem um prato. � normal, n�o fiquem transtornados por isso.

Que o paciente possa se lembrar da bondade daqueles que cuidam dele e pacientemente suporte as sensa��es de dor. Fa�a um esfor�o, n�o permitindo que a mente se torne dispersa e agitada e n�o dificultando as coisas para quem est� cuidando de voc�. Permita que aqueles que cuidam dos doentes preencham a sua mente com virtude e bondade. Que n�o tenham avers�o pelo aspecto repugnante do trabalho, de limpar o catarro e a fleuma ou a urina e excremento. Fa�am o melhor poss�vel. Todos na fam�lia podem ajudar.

Eles s�o os �nicos pais que voc� possui. Eles lhe deram a vida, eles foram os seus mestres, suas enfermeiras e seus m�dicos - eles foram tudo para voc�. Eles os criaram, educaram, compartilharam as suas posses com voc�, fizeram de voc� o herdeiro, esse � o grande benef�cio feito pelos seus pais. Como resultado, o Buda ensinou as virtudes de kata��u e katavedi, conhecer a nossa d�vida de gratid�o e tentar repag�-la. Essas duas virtudes s�o complementares. Se os nossos pais est�o passando por necessidades, se n�o est�o bem ou enfrentando dificuldades, ent�o fazemos o melhor poss�vel para ajud�-los. Isto � kata��u-katavedi, � uma virtude que mantem o mundo. Previne que as fam�lias se separem, faz com que permane�am est�veis e harmoniosas.

Hoje eu lhes trouxe o Dhamma como um presente nesta ocasi�o de enfermidade. N�o tenho coisas materiais para lhes dar; parece que j� existe abund�ncia dessas coisas na casa e assim eu lhes dou o Dhamma, algo que possui um valor de longa dura��o, algo que voc�s nunca conseguir�o esgotar. Tendo recebido de mim, voc�s podem pass�-lo adiante para tantos outros que quiserem e ele nunca ser� esgotado. Assim � a natureza da Verdade. Estou feliz por dar-lhes este presente do Dhamma e espero que lhes d� for�a para lidar com a sua dor.


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